Notícia

Associações LGBTI+ exortam partidos a legislar com urgência a garantia dos direitos das pessoas trans, intersexo e não-binárias

Apelo conjunto das Associações LGBTI+ à Assembleia da República

Lisboa, 1 de julho de 2021

No seguimento da publicação da decisão do Tribunal Constitucional (TC), conhecida ontem, sobre o pedido de fiscalização sucessiva apresentado por pessoas deputadas do PSD,  CSD e PS, em 2019, as associações abaixo subscritas unem-se para exortar a Assembleia da República e respetivos grupos parlamentares a dar início, com carácter de urgência, ao processo legislativo que sane a inconstitucionalidade decidida pelo TC dia 29 de junho e que reponha a dignidade e segurança de crianças e jovens trans, intersexo, pessoas não-binárias e em questionamento identitário em contexto escolar.

A análise de constitucionalidade feita pelo Tribunal Constitucional incide sobre as normas apresentadas nos números 1 e 3 do 12.º artigo da Lei n.º 38/2018, que tratam das “medidas no sistema educativo, em todos os níveis de ensino e ciclos de estudo, que promovam o exercício do direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e do direito à proteção das características sexuais das pessoas“. O Acordão n.º 474/2021 aponta que estas medidas são de competência do Parlamento e não de carácter administrativo.

Tal como referido pelo próprio Coletivo de Juízes, não está em causa o princípio da auto-determinação das identidades trans e não-binárias pelo que “[e]sta decisão deixa intocada a garantia do direito à identidade de género e de expressão de género e a proibição de discriminação no sistema educativo.” A Lei n.º 38/2018 não está em discussão, a auto-determinação das pessoas portuguesas maiores de idade e a possibilidade de alteração de nome e sexo legal no registo civil para maiores de 16 anos não está em perigo.

Relembramos, e apesar de não ser um fenómeno recente, que diariamente um número incontável de pessoas são vítimas de discriminação e preconceito por se afirmarem ou serem percepcionadas como lésbicas, gays, bissexuais, trans e intersexo (LGBTI+). Esta situação é particularmente grave na juventude, etapa de extrema vulnerabilidade à falta de apoio e à exclusão por parte de familiares e pares, suportes fundamentais para o seu bem-estar, segurança e desenvolvimento saudável. Diversos estudos recentes e o trabalho de terreno das várias associações têm permitido documentar as formas como se exprime esta discriminação e o impacto que a mesma apresenta no desenvolvimento destas crianças e jovens. Falamos de jovens que são vítimas de agressões verbais e psicológicas constantes, em risco acrescido de exclusão de práticas de convívio e, em casos extremos, mas infelizmente não tão raros quanto se desejaria, vítimas ou em risco acrescido de agressão física,violência doméstica ou em situação de sem abrigo.

Considerando a decisão de inconstitucionalidade do n.º 3, do artigo 12.º da Lei n.º 38/2018, que foi consubstanciado no Despacho n.º 7247/2019, de 16 de agosto, e o iminente início de um novo ano letivo, ainda sujeito a restrições fruto da atual crise de saúde pública, as Associações abaixo subscritas instam a  Assembleia da República a desenvolver legislação que cumpra com o disposto no Artigo 12º da Lei 38/2018, de 7 de agosto e garantindo a implementação da Estratégia da União Europeia em favor da igualdade das pessoas LGBTIQ 2020-2025 e da Recomendação CM/Rec(2010)5 do Comité de Ministros do Conselho da Europa aos Estados-membros sobre medidas para o combate à discriminação em razão da orientação sexual ou da identidade de género, assegurando que o direito à educação seja efetivamente gozado sem discriminação em razão da orientação sexual, identidade ou expressão de género e características sexuais das pessoas alunas. 

Neste sentido, recomendam as referidas Associações que esta nova legislação:

  1. Reforce medidas de prevenção e combate de todas as formas de bullying e exclusão social, nomeadamente através da adoção de políticas interseccionais de igualdade e segurança em contexto educativo e da criação de mecanismos de denúncia para as situações de discriminação e violência em ambiente escolar;
  2. Promova a adoção de códigos de conduta inclusivos e criação de programas de sensibilização e formação certificada específica – inicial e contínua – em matéria de igualdade e não-discriminação para pessoal docente e não docente, bem como iniciativas de sensibilização para as associações de pais e mães e de encarregados/as de educação e pessoas alunas, envolvendo organizações LGBTI+ nas mesmas;
  3. Fomente a diversidade de conteúdos e autoras/es em currículos escolares e planos nacionais na área da educação e diversifique a representatividade de identidades e estruturas familiares nos respetivos manuais escolares;
  4. Promova a recolha de informação estatística e a produção de conhecimento regular sobre o ambiente escolar, adequação de conteúdos e inclusão de crianças e jovens de comunidades específicas;
  5. Incentive a criação de campanhas multimeios de sensibilização e informação para a diversidade e igualdade em contexto educativo.

As subscritoras:

Associação AMPLOS
Associação Casa Qui
Associação ILGA Portugal
Associação Plano i
Associação Queer Tropical
Associação rede ex aequo
Associação TransMissão – Associação Trans e Não-Binária