Notícia

Mais inclusão no serviço militar

GAT, Ser + e ILGA Portugal celebram fim da exclusão de pessoas com VIH, trans e não-binárias nas novas Tabelas Gerais de Aptidão e Capacidade para o serviço militar.

Na semana passada, mais de duas décadas depois da última aprovação das tabelas de inaptidão e incapacidade para a prestação de serviço por militares das Forças Armadas, foram finalmente aprovadas as novas tabelas gerais de aptidão e de capacidade para a prestação de serviço por pessoas militares e militarizadas nas Forças Armadas e para a prestação de serviço na Polícia Marítima.

Depois de um trabalho concertado de ação junto do Governo, GAT, Ser+ e ILGA Portugal veem com grande satisfação a conquista de mais um marco histórico anti-discriminação no que respeita à infeção pelo VIH e ao acesso das pessoas trans ou não-binarias. Ao contrário do que acontecia no passado, os novos critérios deixam de classificar automaticamente estas pessoas como inaptas e automaticamente excluídas, passando a estarem sujeitas a avaliação individual que, tal como nas demais pessoas candidatas, confirme caso a caso se há limitações físicas ou psicológicas que possam ser concretamente incapacitantes para o desempenho das funções militares.

No caso específico da infeção VIH, os grandes avanços feitos nas últimas duas décadas no tratamento e controlo desta infeção – com repercussões na qualidade e esperança média de vida das pessoas que vivem com VIH, mas também na sua transmissibilidade – entravam em conflito direto com práticas ultrapassadas e que ainda ditavam que a presença desta infeção fosse um critério linear de exclusão no ingresso às diferentes carreiras das Forças Armadas. Inclusive, desde 2012 que havia recomendações da Provedoria de Justiça e pareceres do Colégio da Especialidade de Doenças Infeciosas que justificaram o fim urgente destes critérios arbitrários.

No caso das pessoas trans ou não-binárias, e sendo públicos diagnósticos discriminatórios de hipogonadismo em relação às pessoas trans com base nas tabelas de 1999, era por demais fundamental eliminar qualquer prática discriminatória baseada em identidade de género e características sexuais, deixando de submeter as pessoas trans e não-binárias à mesma avaliação a que são sujeitas as pessoas cisgénero – tal como, aliás, é já prática de forças armadas de outros países – deixando cair, neste caso, critérios não aplicáveis às pessoas trans dado estarem associados ao sexo biológico, como é o caso do diagnóstico de hipogonadismo.

Não encontrando suporte na evidência científica atual, a manutenção destas inaptidões no acesso às diferentes carreiras das Forças Armadas violava princípios éticos fundamentais e direitos constitucionais, nomeadamente as normas relativas à proteção no emprego, a lei da autodeterminação de género ou a Lei n.º 46/2006, que proíbe a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde. Intervindo nestas áreas há várias décadas, com trabalho próximo não só com as pessoas afetadas, mas também com a comunidade científica, acreditamos que as novas tabelas permitem um grande avanço no cumprimento das melhores práticas não só a nível médico/científico, como a nível ético e de inclusão e não discriminação.

As Organizações Não-Governamentais, que ainda em julho deste ano se tinham unido novamente para apelar à alteração urgente destes critérios, apelam agora a que, para lá das tabelas, haja uma fiscalização transparente e o reforço das políticas específicas anti-discriminação com base nas condições de saúde, orientação sexual, identidade de género ou na autodeterminação de género, estabelecendo mecanismos de formação e capacitação de equipas e garantindo ainda o apoio e acesso aos melhores cuidados e, no caso de militares trans que estejam em serviço, o apoio nos seus processos de afirmação, incluindo os que necessitem de cuidados médicos e/ou cirúrgicos.