Monkeypox: Organizações da Sociedade Civil enviam apelo ao Ministério da Saúde, DGS e INFARMED
O vírus Monkeypox está presente em Portugal desde maio deste ano, altura em que as organizações da sociedade civil começaram a acompanhar a situação epidemiológica junto da DGS e das pessoas afetadas. Na altura, denunciámos a perpetuação de narrativas estigmatizantes veiculadas por alguns meios de comunicação e redes sociais que, por preconceito e num já conhecido caminho de desresponsabilização, associaram a orientação sexual à propagação de doenças.
De maio para o presente, os casos aumentaram em Portugal, mas também por todo o mundo, levando a OMS a declarar a Monkeypox como uma emergência global de saúde pública em julho. É necessário que fique claro: embora o vírus Monkeypox possa infetar qualquer pessoa, à data de hoje as dinâmicas de transmissão do vírus, que não são estanques e podem alterar-se a qualquer momento, têm impactado maioritariamente a vida de homens, de entre os quais homens gays, bissexuais e outros HSH – homens que têm sexo com homens.
O acompanhamento da situação epidemiológica permite compreender a complexidade deste novo surto e a necessidade de implementar normas e estratégias de vacinação equitativas. Lembramos o surto de hepatite A em 2017, cujas dinâmicas de transmissão tiveram incidência expressiva em homens gays, bissexuais e outros HSH, e que foi controlado com a ajuda de uma estratégia de vacinação preventiva dirigida.
As Organizações Não Governamentais (ONG) que assinam abaixo vêm pedir ao Ministério da Saúde, DGS e INFARMED que tomem as decisões necessárias que permitam o uso preventivo de parte das vacinas para as pessoas em maior risco, continuando a vacinar em pós-exposição os contactos de casos positivos;
Dada a aparente escassez de vacinas, é urgente autorizar a administração intradérmica (validada pela FDA, EMA e DG SANTE) que, de acordo com a evidência que existe neste momento, pode permitir vacinar até 5 pessoas com uma só ampola;
Falta também uma comunicação clara e transparente sobre a situação europeia em relação às vacinas disponíveis (garantindo o uso das vacinas pós-exposição) e o calendário de entregas;
Falta ainda comunicação e informação de caráter público, em Portugal e na Europa, que nos auxilie a reivindicar o aumento da produção de vacinas e a fazer pressão sobre a indústria farmacêutica e a UE, de modo a garantir a cobertura de todas as necessidades, em todos os países e não apenas nos países mais ricos. Parece-nos que a posição da Bavarian Nordic, a companhia detentora da patente da vacina, que não faz acordos com outras empresas com capacidade de produção instalada e pede um preço exorbitante por cada vacina, não é aceitável num cenário de crise de saúde pública.
Cumpre-nos, por isso, exigir e unir esforços para que as autoridades nacionais exerçam a diplomacia necessária junto dos organismos europeus, de modo a que fique claro que a saúde pública não pode estar refém de lógicas de mercado e de racionamentos com base em critérios geopolíticos que extravasam a preocupação central com a saúde humana. Se há países onde já existe um regime de vacinação em modo “casa aberta” para as pessoas que têm sido mais afetadas (pessoas com múltiplas pessoas parcerias sexuais, pessoas que tenham contraído recentemente ISTs, homens gays, bissexuais e outros HSH, principalmente com múltiplas parcerias, pessoas trabalhadoras do sexo – e outras pessoas com maior risco de exposição, neste momento ou em momentos futuros), este é o caminho a seguir.
Enquanto estruturas associativas de intervenção política, social e comunitária, cumpre-nos alertar para esta situação e apelar para que não se repitam erros históricos que ainda hoje estão por sanar. A vida pública e privada de pessoas LGBTI+, mas também das pessoas com VIH e pessoas migrantes, continua a ser altamente escrutinada dentro do espectro danoso do preconceito, abrindo novos fossos no já pouco seguro acesso a cuidados de saúde céleres e dignos. As pessoas têm o direito a prevenir e a tratar da sua saúde sem receio de discriminação, ‘outing’ e violência.
Continuaremos a acompanhar de perto a situação junto das entidades competentes, em articulação com outras entidades da sociedade civil. Há que averiguar e esclarecer as queixas de pessoas que reportam que nos cuidados de saúde não obtiveram um atendimento de acordo com as recomendações internacionais (não só em matéria de prevenção, mas também de tratamento).
Por fim, cumpre-nos apelar a todos os serviços e entidades de saúde, mas também a espaços formais de sociabilidade, por um papel ativo na passagem de informação cientificamente fidedigna e na desconstrução de preconceitos. A prevenção e a reivindicação por uma ação global célere e digna cabem a todas as pessoas.
Organizações subscritoras:
Associação ILGA Portugal – Intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo
GAT – Grupo de Ativistas em Tratamentos
MTS – Movimento dxs Trabalhadorxs do Sexo
Opus Diversidades
Panteras Rosa – Frente de Combate à LesBiGayTransfobia
Poly Portugal
Projeto Anémona
rede ex aequo – associação de jovens lgbti e apoiantes
Variações – ACT LGBTI Portugal
Ser +
AJPAS
Associação Positivo
APF – Associação para o Planeamento da Família
AMPLOS – Associação de Mães e Pais pela Liberdade de Orientação Sexual e Identidade
de Género
Grupo de Partilha d’a Vida (GPV)
Liga Portuguesa Contra a SIDA
Acompanha, CRL
Ares do pinhal, ONG
AHSeAS
Associação Existências
Abraço
Queer Tropical
Por Todas Nós
Casa T
APDES