Mundial de Futebol Masculino no Qatar – Os Direitos Humanos Não São Um Jogo
Com o arranque do Mundial de Futebol Masculino, o espaço mediático tem sido finalmente (e bem) inundado pela discussão em torno do contexto que levou uma competição desportiva desta dimensão ao Qatar. Este é um dos países do mundo onde os Direitos Humanos Fundamentais mais são ameaçados, com punições pesadas para o exercício da liberdade de todas as pessoas, nomeadamente das mulheres, pessoas racializadas, minorias étnicas, migrantes e pessoas LGBTI+.
As questões levantadas quanto à legitimidade deste evento e as denúncias feitas quanto aos atropelos dos mais básicos direitos humanos não tiveram qualquer efeito na resolução dos graves problemas apontados. Os movimentos cívicos e ativistas têm também nestes anos vindo a destapar a realidade de conivência que os governos, instituições e empresas têm para com um evento responsável pela morte de milhares de pessoas trabalhadoras. Um evento que promete continuar a excluir e a colocar em risco outras tantas.
Sabemos amplamente o papel que o desporto tem na saúde física e mental das pessoas, e isto é ainda mais claro no caso das pessoas LGBTI+, que historicamente se vêem excluídas das práticas desportivas, praticadas de forma informal ou profissional, numa situação transversal a modalidades e países.
Sabemos também que os Direitos Humanos não podem ser dissociados de eventos desportivos mundiais, que tanto nos dizem sobre geopolítica e sobre o compromisso que os países têm na proteção das pessoas LGBTI+.
Assim, relembramos que no Qatar a homossexualidade é punida por lei, bem como todas as demonstrações de orientações sexuais e identidades ou expressões de género não normativas. Relembramos que as pessoas LGBTI+ não estão seguras no Qatar, sejam elas nacionais ou não. Relembramos que a suposta abertura do Qatar a pessoas visitantes no contexto do Mundial de Futebol Masculino é mera retórica, uma vez que nada indica que a segurança das pessoas LGBTI+ venha a ser garantida dentro do país. Esta alegada tolerância momentânea confirma também o estatuto excecional da medida, com o regresso à perseguição das pessoas LGBTI+ residentes no país após o término do evento. Relembramos também que a FIFA pretende que este seja um evento apolítico, mas, simultaneamente, tem excluído países da competição por motivos políticos ao longo dos anos.
Denunciamos a FIFA e as várias entidades envolvidas na promoção do evento que até à data de hoje têm feito vista grossa aos Direitos Humanos no Qatar.
Ao organizar um evento no Qatar e ao reprimir sistematicamente todas as formas de demonstração de apoio às pessoas LGBTI+ e de protesto contra um regime onde os Direitos Humanos não entram, a FIFA perdeu a oportunidade para afirmar peremptoriamente que as vidas das pessoas, e não só as das pessoas LGBTI+, valem mais do que os investimentos e patrocínios milionários que receberam.
Lamentamos que o Governo português e a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) não tenham colocado a sua diplomacia e influência ao serviço dos Direitos Humanos, esquivando-se a uma posição robusta e concertada sobre a situação no Qatar.
É com profundo pesar que vemos Portugal a ter novamente uma posição dita “neutra” sobre a defesa dos Direitos Humanos.
Para além das várias demonstrações públicas de desagrado da parte da ILGA Portugal, já contactámos a Federação Portuguesa de Futebol , com o apelo inequívoco a um posicionamento pró-direitos Humanos e LGBTI+. Gestos como o hastear da bandeira arco-íris na sua sede, momentos simbólicos antes e durante os jogos e a promoção de políticas de inclusão e diversidade no contexto do futebol nacional são iniciativas que a FPF pode promover para dar visibilidade e concretizar uma maior igualdade no desporto. Um desporto que seja, efetivamente, para todas as pessoas e em qualquer lugar do mundo.